segunda-feira, 18 de julho de 2011

LEMBRANÇAS DE UM CAVALO

Um dia, minha mãe me contou sobre o dia em que eu nasci. Era uma manhã quente e ensolarada. A grama verde foi o meu primeiro contato com esse mundo. Ela ficou feliz e me acariciou enquanto me limpava amavelmente com sua língua suave.
Meus primeiros passos foram seguidos por alguns tombos, mas ela estava sempre por perto, me incentivando para que eu conseguisse caminhar e brincar. Aos poucos fui me soltando e conhecendo o mundo à minha volta, com a alegria de um potrinho descobrindo a vida.
Morávamos em um lugar bonito e bem cuidado por alguns humanos que nos davam abrigo, água e comida. Não me esqueço jamais daquele dia em que tivemos aquela amável conversa. Parecia que algo estava para acontecer, pois minha mãe me contara sobre os meus primeiros passos quando eu já tinha alguns meses de vida, parecendo que ela pressentira algo diferente naquele dia. Foi o último dia em que nos vimos. Ao final da tarde, alguns homens que trabalhavam naquele lugar, me separaram à força de minha mãe e me empurraram para dentro de um caminhão, como se um pertencesse a eles e não àquela que me concebeu.
Eu estava assustado, mas minha mãe estava desesperada e inconsolada com o que estava acontecendo.
O caminhão que me roubara de minha mãe, foi lentamente se afastando do lugar onde eu fora feliz, e minha mãe em prantos, tentava fugir em vão do cercado em que vivia para me salvar. Jamais esquecerei aquele olhar dela ficando cada vez mais distante, sabendo que seria a última vez que estávamos nos vendo.
Não me esqueço dos carinhos, do aconchego, da sua presença e do amor que me entregou naqueles dias. Sinto muito a sua falta. Não sei bem ao certo a que distância estamos um do outro, mas sua presença é constante para mim. Tenho a certeza de que ela, se ainda estiver bem, não deixou de pensar em mim um só instante, assim como eu penso nela a cada por de sol. Sei que nossos pensamentos se cruzam, pois apesar da distância, ainda nos amamos.
Aqui onde eu moro, a vida é bem difícil para mim. Antes mesmo de o dia amanhecer, sou colocado para puxar uma carroça, que aos poucos vai ficando mais e mais pesada. Quanto mais pesada ela fica, mais dificuldades eu tenho para puxá-la, e aí, mais chicotadas e até chutes eu recebo. As dores que eu sinto pelo corpo e o cansaço são terríveis. Enquanto puxo aquela carroça pelas ruas, abaixo de gritos e chicotadas, meu pensamento se dirige para minha mãe, tentando imaginar como e onde ela está, ou mesmo lembrando-se de minha infância ao lado dela. Nesses momentos de recordação, eu até me esqueço das dores, da fome e da sede.
Em dias de festas, sou levado para onde os humanos se reúnem para se apresentarem em cima dos meus semelhantes ou para derrubar vacas e bois com laços. Vejo que não sou o único a sofrer. Vejo muitos outros potros, éguas, cavalos, bois e vacas que passam fome e sede, que dormem sobre uma fria geada e apanham para que os humanos façam as suas apresentações, dando esses pobres animais, o máximo de si nessas apresentações, para que não apanhem mais ainda. Os humanos acham que realizamos as provas por vontade própria. Como se enganam. Fazemos isso, para não sofrermos ainda mais com o que para nós é violência e para eles diversão.
Agora, quando já estou magro, doente e quase não consigo parar sobre as minhas próprias pernas, vivo quase no abandono. Mal ganho comida e água, mas os gritos e chicotadas ainda não me faltam.
Essa semana, eu vi uma cena que cravou em meu coração e apunhalou os meus sentimentos. Presenciei com tristeza, enquanto passava por um bairro aqui da cidade, puxando meu pesado fardo, um cavalo que de tão fraco que estava, e tentando tomar água em uma valeta enlameada, tropeçou para dentro dessa valeta, ficando preso até o pescoço pela lama. Foram várias horas de angústia e sofrimento em que várias pessoas de bom coração tentaram retirar aquele cavalo. Era um dia frio e o socorro demorou em chegar e, a cada minuto que se passava, aquele pobre cavalo ficava mais e mais fraco. Mesmo tendo sido resgatado e medicado, infelizmente esse meu semelhante não resistiu e faleceu ali mesmo, bem próximo daquela valeta.
Fico pensando na dor e no sofrimento que ele sentiu e, por isso, dedico todo esse meu relato a esse pobre cavalo que morreu no abandono, e torço para que os seres humanos se tornem mais humanos no verdadeiro sentido da palavra, e que todos os animais possam um dia ser mais felizes, como um dia eu fui, quando ainda ao lado de minha mãe que jamais irei esquecer.
Leandro Ditzel
Membro da Academia de Letras, Artes e
Ciências do Centro-Sul do Paraná - ALACS

domingo, 17 de julho de 2011

O FOGO DA VIDA E DA MORTE


O fogo, sem dúvida, foi a maior descoberta que o ser humano já fez. Sem ele não teria sido possível chegar aonde nós chegamos. Com ele pudemos nos defender dos inimigos, aprimorarmos a nossa maneira de nos alimentar e nos desenvolver enquanto espécie, pois até em altas tecnologias, precisamos dele como princípio para força motriz. Ao longo dos milênios, ele foi tema dos mais variados tipos de interpretação e tema preferido por vários artistas e teóricos que deram um ar místico a essa reação química.
Hoje, para muitos, o fogo representa beleza, mistério ou simplesmente uma forma de promover “limpeza” em terrenos baldios ou ainda, um método de preparação para o plantio. No meu ponto de vista, o fogo pode ser a representação do inverso de tudo isso. Pode representar a destruição, a poluição, a morte de seres vivos indefesos, ou mesmo, um crime ambiental se usado de maneira irresponsável.
Nesses dias de inverno em que as geadas e a umidade baixa do ar se tornam algumas das características da estação, temos uma alta incidência de queimadas descontroladas, e até mesmo criminosas, que ocasionam sérios problemas à saúde e ao meio ambiente.
Os índices de problemas de saúde, principalmente os respiratórios ocasionados pelo acúmulo de fumaça das grandes e pequenas queimadas tendem a aumentar significativamente nesse período, ocasionando desconforto e uma busca acentuada pelos serviços de saúde, gerando gastos que poderiam ser desnecessários se as tais queimadas não ocorressem.
Outros problemas sérios são os transtornos ao trânsito que se torna perigoso em função da diminuição da visibilidade, danos à rede elétrica e telefônica e grande número de chamadas que causam acúmulo de trabalho ao corpo de bombeiros.
Que os problemas ocasionados são inúmeros, todo mundo sabe, mas o que eu quero tratar aqui é com relação ao que pouca gente não se dá conta, ou simplesmente não dá a mínima atenção, que é a morte dos animais que morrem queimados em terrenos baldios e matas incendiadas.
O número de espécies de pássaros, lagartos, preás, entre outros, que morrem nas queimadas é enorme, e pouquíssimas pessoas se preocupam com a sua sobrevivência. Porém, várias dessas espécies que ainda são encontradas em nossa região, sobrevivem em pequenas áreas de terrenos e várias delas, estão quase extintas.
Essa semana, mais precisamente na noite de 15 de julho, uma série de incêndios criminosos deixaram várias pessoas aqui de Irati, revoltadas e comovidas com cenas de animais sendo consumidos pelas chamas. Eu mesmo, ao perceber que próximo da minha residência, vários terrenos haviam sido atacados por algum incendiário, procurei ajudar tentando apagar algumas chamas, ao meio de uma densa e irritante coluna de fumaça, quando então, me deparei com uma das cenas mais terríveis que presenciei até hoje, onde vários preás tentando fugir com sua pelagem já em chamas acabaram morrendo sem que eu ou alguém conseguisse fazer alguma coisa.
Tentamos em vão, pois infelizmente, não foi possível. Houve desespero por parte daqueles que lutaram para fazer alguma coisa, mas com certeza muito mais, por parte daqueles pobres animaizinhos que perderam a sua vida.
Pela manhã ao retornar ao local, me deparei com cenas que deixam qualquer cidadão de bem indignado. Cabos de telefone queimados sendo trocados pela empresa responsável, causando prejuízo e transtornos para a sociedade, acúmulo de cinza dando ar de desolação e o pior, um amontoado de animais carbonizados que deixa qualquer pessoa que tenha o mínimo de bom senso, extremamente chocado.
Quem irá pagar pelos estragos? Quem irá ser responsabilizado? Quem irá devolver a vida àqueles pobres animaizinhos que tiveram suas vidas consumidas pelas chamas?
Queimada é crime e como tal, deve ter punição. Não fique indiferente. Não permita que as queimadas na cidade ou na área rural continuem acontecendo. FAÇA A SUA PARTE. NÃO QUEIME! DENUNCIE!
A vida agradece!
Leandro Ditzel
Membro da Academia de Letras, Artes e
Ciências do Centro-Sul do Paraná - ALACS